A lista que a seguir se apresenta não é exaustiva, mas integra a grande maioria dos livros editados em 2013. Ela mostra que este foi um ano especialmente bom para a poesia portuguesa. Porque surgiram dois ou três livros assombrosos. Porque houve um conjunto alargado de outros muito bons. Porque surgiram novos autores que muito prometem. Porque apareceram novas editoras e colecções de poesia. Porque poetas mais velhos são capazes de se reinventar. Porque a poesia resiste (desde logo à sua própria academização). No entanto, o cenário global está longe de ser favorável. Os sinais negativos também continuam a acentuar a perda de valor simbólico da poesia e dos poetas no conjunto das forças do campo literário. O que significa isto? Significa que a poesia continua sem encontrar um número relevante de leitores e perde cada vez mais terreno no catálogo das editoras portuguesas. Tão grave como esta perda de valor simbólico é a questão da crítica, que se mostra cada vez mais dominada por lógicas de grupos e de amizades/afinidades pessoais, que corroem a necessária confiança do leitor. E a verdade é que sem uma crítica independente, forte e audaz todos ficam a perder: poetas, leitores e críticos. Dito isto, avancemos para os livros.
A) ANTOLOGIAS & VOLUMES COLECTIVOS
1) AAVV, Resumo - A poesia em 2012, poemas escolhidos por Armando Silva Carvalho, José Alberto Oliveira, Luís Miguel Queirós e Manuel de Freitas, Documenta/FNAC.
2) AAVV, Em Lisboa, sobre o mar - Poesia 2001-2010, poemas escolhidos por Ana Isabel Queiroz, Luís Maia Varela e Maria Luísa Costa, Fabula Urbis.
3) AAVV, Lobos, Língua Morta.
4) AAVV, Quarto de hóspedes, Língua Morta.
5) AAVV, Esta casa, Averno.
6) AAVV, e chorava como quem se diluía em mel d' abelhas, Tea For One.
B) REVISTAS
1) Telhados de Vidro, nº 18, Lisboa, maio, Averno.
2) Cão Celeste, Lisboa (2 números: maio e novembro).
3) Relâmpago, nº duplo (31 e 32), Lisboa, outubro a abril, Fundação Luís Miguel Nava.
4) DiVersos, nº 18, Águas Santas, Edições Sempre em Pé.
5) Piolho, nº 11, Porto, Edições Mortas.
C) LIVROS DE AUTOR
1) Herberto Helder, Servidões, Assírio & Alvim.
2) Golgona Anghel, Como uma flor de plástico na montra de um talho, Assírio & Alvim.
3) Manuel Gusmão, Pequeno tratado das figuras, Assírio & Alvim.
4) Helder Moura Pereira, Pela parte que me toca, Assírio & Alvim.
5) Helder Moura Pereira, Eu depois inventei o resto, Companhia das Ilhas.
6) Gastão Cruz, Fogo, Assírio & Alvim.
7) José Tolentino Mendonça, A papoila e o monge, Assírio & Alvim.
8) Miguel-Manso, Tojo - poemas escolhidos, Relógio D' Água.
9) Miguel-Manso, Supremo 16/70, Artefacto.
10) Rui Nunes, Uma viagem no outono, Relógio D' Água.
11) António Carlos Cortez, O nome negro, Relógio D' Água.
12) Nuno Júdice, Navegação de acaso, D. Quixote.
13) Maria Teresa Horta, A dama e o unicórnio, D. Quixote.
13) Maria Teresa Horta, A dama e o unicórnio, D. Quixote.
14) Rosa Oliveira, Cinza, Tinta da China.
15) Luis Quintais, Depois da música, Tinta da China.
16) A.M. Pires Cabral, Gaveta do fundo, Tinta da China
17) João Luís Barreto Guimarães, Você está aqui, Quetzal.
18) Nunes da Rocha, Óculos sujos, fígado gordo, & etc.
19) José Luís Costa, Da Madragoa a Meca, & etc.
20) José António Almeida, Arco da Porta do Mar, & etc.
21) Margarida Ferra, Sorte de principiante, & etc.
22) António Barahona, As grandes ondas, Averno.
23) Inês Dias, Um raio ardente e paredes frias, Averno.
24) Tiago Araújo, Respirar debaixo de água, Averno.
25) Jaime Rocha, O vulcão, o dorso branco, Averno.
25) Jaime Rocha, O vulcão, o dorso branco, Averno.
26) Abel Neves, Quasi stellar, Língua Morta.
27) José Carlos Soares, O visitante paralelo, Língua Morta.
28) Alexandre Sarrazola, View-master, Língua Morta.
29) Daniel Jonas, Passageiro frequente, Língua Morta.
30) José Manuel Teixeira da Silva, O lugar que muda o lugar, Língua Morta.
31) Fernando Guimarães, Os caminhos habitados, Afrontamento.
32) Manuel de Freitas, Pontas do mar, Paralelo W.
33) Marta Chaves, Pedra de lume, Paralelo W.
34) José Ricardo Nunes, Compositores do período barroco, Deriva.
35) Ricardo Gil Soeiro, Bartlebys reunidos, Deriva.
36) R. Lino, Baixo-relevo, Companhia das Ilhas.
37) Madalena de Castro Campos, O fardo do homem branco, Companhia das Ilhas.
38) Rosalina Marshall, Manucure, Companhia das Ilhas.
39) Manuel Paes, Fata morgana, Tea For One.
40) Manuel Filipe, Lisboa oriental, Tea For One.
41) Manuel Filipe, À beira de Cesário, edição de autor.
42) João Vasco Coelho, Na ordem do dia, Artefacto.
43) Frederico Pedreira, Doze passos atrás, Artefecto.
44) Rui Almeida, Leis da separação, Medula.
45) Jorge Reis-Sá, Instituto de antropologia, Glaciar.
46) E.M. de Melo e Castro, 15 odes ocas, Pé de Mosca.
47) Regina Guimarães, Comer a língua, Pé de Mosca.
48) Nuno Moura, Canto nono, Douda Correria.
49) Ernesto Rodrigues, Do movimento operário e outras viagens, Âncora.
50) Maria sousa, Mulher ilustrada, Do lado esquerdo.
51) Rui Azevedo Ribeiro, Bombo, 50 kg.
52) Rui Caeiro, Um gato no inferno, edição do autor.
53) Delfim Lopes, No cumprimento do devir, edição do autor.
54) Nuno Dempster, Uma paisagem na web, & etc.
55) Ricardo Marques, Servidões, não (edições).
56) Marta Navarro, E se por hipótese esta máquina começasse a funcionar agora e desse início ao longo processo tentativa-erro, a tua mãe.
57) Pedro Tamen, Rua de nenhures, D. Quixote.
D) ENTRE A POESIA & OUTRA COISA
54) Nuno Dempster, Uma paisagem na web, & etc.
55) Ricardo Marques, Servidões, não (edições).
56) Marta Navarro, E se por hipótese esta máquina começasse a funcionar agora e desse início ao longo processo tentativa-erro, a tua mãe.
57) Pedro Tamen, Rua de nenhures, D. Quixote.
D) ENTRE A POESIA & OUTRA COISA
1) Adília Lopes, Andar a pé, Averno.
2) Beatriz Hierro Lopes, É quase noite, Averno.
3) Henrique Manuel Bento Fialho, Suicidas, Deriva.
4) Frederico Pedreira, O artista está sozinho, edição do autor.
5) Rui Pires Cabral, Broken, Paralelo W.
6) Rui Pires Cabral, Álbum, Nenhures.
E) AUTORES ESTRANGEIROS & TRADUÇÕES
1) João Vário, Exemplos, Tinta da China.
2) Wislawa Szymborska, Um passo da arte eterna, Esfera do Caos (trad. de Teresa Fernandes Swiatkiewicz).
3) Álvaro Mutis, Os versos do navegante, Assírio & Alvim (trad. de Nuno Júdice).
4) Antonio Gamoneda, Oração fria, Assírio & Alvim ( trad. de João Moita).
5) Amalia Bautista, Estou ausente, Averno (trad. de Inês Dias).
6) Gez Walsh, A borbulha no rabo, Companhia das Ilhas (versão em português Helder Moura Pereira).
7) Antonio Orihuela, Que o fogo recorde os nossos nomes, Medula (trad. de Manuel A. Domingos).
8) Robert Bréchon, Ecos reflexos miragens - poemas (1947-2002) seguidos de um Elogio da Imitação, Afrontamento (trad. de Maria João Fernandes, Caroline Mascarenhas e António Ramos Rosa).
9) Pierre Reverdy, Respirar pelo coração, Língua Morta (trad. de Hugo Pinto Santos).
10) AAVV, Estradas secundárias - doze poetas irlandeses, Artefacto (trad. Hugo Pinto Santos).
Algumas notas muito breves:
a) Servidões: um livro tocado pela graça. Mesmo quando a dessacraliza.
b) No que respeita a antologias e volumes colectivos, destaco Lobos e Quarto de hóspedes, publicados pela Língua Morta. São obras marcantes por razões diferentes: Lobos tem uma dimensão guerrilheira que urge salientar; Quarto de hóspedes é uma obra notável que reune poemas de cerca de quarenta autores de diferentes gerações e nacionalidades. Encontro aqui alguns dos melhores poemas do ano. De referir, ainda, que a Tea For One publicou o quarto volume da sua deliciosa colecção de pequenas antologias temáticas. Depois do vinho, do azeite e do pão, saiu agora o volume sobre o mel. Uma delícia.
c) De que falamos quando falamos de revistas? Temos a "nova" Cão Celeste que procura agitar águas críticas e poéticas; a Relâmpago com uma clara vocação canonizante; a Telhados de Vidro com colaborações de grande nível e, por último, duas revistas das margens (geográficas - a DiVersos - e poéticas - a Piolho, com a sua aparência de fanzine punk). Mas falta aqui qualquer coisa. Que surpreenda. Que rompa e faça a diferença.
d) Cada vez mais a poesia é um assunto de pequenas e micro-editoras, situação com vantagens para autores novos e estreantes, mas claramente prejudicial para a afirmação "pública" da própria poesia. Como é óbvio, é louvável que a poesia surja como um discurso de resistência, não se deixando enlear na rede das facilidades, ou mediocridades, culturais e mediáticas. Mas, como se disse acima, o facto é que ela parece incapaz de alargar o seu campo de acção, começando por chegar a mais leitores. Edições de 150, 200, no máximo 300 exemplares (neste capítulo, as edições esgotadas de Herberto são outra conversa, e nada têm a ver com poesia), mostram como está praticamente confinada às suas próprias fronteiras, funcionando em circuito fechado. Não vejo como isto possa ser benéfico.
e) Alguns dados: a Assírio & Alvim, a Averno e a Língua Morta pela qualidade e quantidade (8 cada uma) dos livros publicados são as "grandes" editoras de poesia em Portugal. A Averno - ou os seus editores - publica ainda as revistas Telhados de Vidro e Cão Celeste. É impressionante, não é? Excluíndo a Assírio, quem poderá publicar as antologias de poesia portuguesa capazes de fazer o ponto da situação? Quem vai avançar com traduções e antologias de autores estrangeiros? Uma pequena editora como a Artefacto (responsável pela excelente, mas esquálida selecção de poetas irlandeses)? Veja-se: a D. Quixote publicou apenas dois livros de poesia; a Quetzal apenas um; a Relógio D' Água três. Sejamos claros: por extraordinário que seja o seu trabalho, as pequenas editoras não têm capacidade nem vocação para investir em projectos mais ambiciosos, necessários à confrontação da poesia nacional consigo mesma e com outras tradições ou práticas poéticas. Será pedir muito? Deve ser. Bom, para além das referidas editoras, merecedoras de elogio são (também) a Companhia das Ilhas, que lançou algumas vozes novas, e a Tinta da China, que criou uma colecção (dirigida por Pedro Mexia) que concilia a revelação de autores inéditos com a publicação de nomes "consagrados" (A.M. Pires Cabral e Luís Quintais, poetas que transitam da Cotovia). Referência fundamental continua a ser a & etc, que nos ofereceu um livro extraordinário, de Nunes da Rocha, um dos melhores do ano no ano de celebração do quadragésimo aniversário da chancela, efeméride devidamente assinalada por um belo volume editado pela Letra Livre (& etc - uma editora no subterrâneo, coordenação editorial e concepção gráfica de Paulo da Costa Domingos).
f) Já referi alguns dos livros que mais me interessaram este ano (o de Herberto, o de Nunes da Rocha, a antologia dos poetas irlandeses, os livros colectivos da Língua Morta...), mas outros merecem ser assinalados, todos de grande qualidade: As grandes ondas, de António Barahona; Uma viagem no outono, de Rui Nunes; Tojo - poemas escolhidos, de Miguel-Manso; Como uma flor de plástico na montra de um talho, de Golgona Anghel; Respirar debaixo de água, de Tiago Araújo; Um raio ardente e paredes frias, de Inês Dias ou Andar a pé, de Adília Lopes. Bastante bons são também os livros de Daniel Jonas, ou de José Manuel Teixeira da Silva, que não tiveram qualquer repercussão crítica. E o de Nuno Moura. E os de Álvaro Mutis, de Wislawa Szymborska, de Amalia Bautista. E outros mais, a lista podia continuar. Em suma, uma colheita de grande nível, pedras preciosas para combater o cerco a que estamos sujeitos, hoje, neste lugar que precisa urgentemente de se reinventar.
(P.s. - Só há listas incompletas. Por isso quero agradecer aos leitores atentos que me fizeram chegar informações e observações sobre livros e revistas publicados esta ano e que não consta(va)m da lista apresentada. Sugiro, por isso, a leitura dos comentários feitos a este post. Saliento ainda que, por outro lado, lendo hoje o "Atual" do Expresso me dei conta de que não assinalei as importantes reedições das obras de Sophia de Mello Breyner (Assírio & Alvim) e de Jorge de Sena (Guimarães) ou, ainda, de Manuel de Gusmão (Avante), de Eugénio de Andrade (Assírio & Alvim) e de Francisco Duarte Mangas (Modo de ler). E devo reconhecer que estes projectos editoriais atenuam, em parte pelo menos, algumas das observações críticas e pessimistas apresentadas acima. Acrescento, por último, à lista inicial um conjunto de livros que, por lapso ou desconhecimento, não surgiam na mesma).
(P.s. 2 - Acrescentem-se ainda: a notável reunião da obra poética de Manuel de Castro, Bonsoir, Madame, um feito absolutamente extraordinário em co-edição Alexandria/Língua Morta, sem dúvida um dos grandes acontecimentos editoriais do ano, a par das Servidões herbertianas; Flúor, de Andreia C. Faria, Textura e Teatro de rua, de Tatiana Faia, Do lado esquerdo; quanto a revistas, a Piolho publicou ainda o seu número 12, dedicado à tradução, e a Egoísta dedicou o seu último número à poesia).